Hoje no treino do meu puto em Benfica, debaixo de um ar podre de fumo de floresta a arder e de um calor infernal, lá me saiu um "esta merda devia era arder toda". As pessoas não percebem, ou não querem perceber, anda tudo tão enterrado e a focinhar no seu mundinho, que só mesmo quando esta merda arder toda é que vão acordar.
Felizmente há quem perceba.
Regresso debaixo de um calor infernal, transformado numa extensa nuvem negra ainda antes de avistamos a ponte de Santarém. Paro nos Vidais para atestar o depósito. Cai cinza do céu como se nevasse, autênticos flocos de neve metendo-se pelas narinas adentro e dificultando a respiração. Na caixa de correio, cerca de 50 folhetos anunciam o regresso às aulas. Concluo que as aulas transferiram-se da escola para as superfícies comerciais. Vou explicar isso mesmo às minhas filhas: se querem conhecer o mundo que vos espera, atentem-se neste fenómeno. Têm aqui leitura para a vida que poderá ser-vos muito útil na aprendizagem da matemática (comparar preços), da língua portuguesa (interpretar campanhas) e do estudo do meio (pensar sobre o assunto). O cenário é desolador, deprimente. Chamam a isto progresso, a este mergulho dos homens num desespero consumista que torna insuportavelmente frenética a vida quotidiana. Não me conformo e sofro, expresso aqui o meu sofrimento. Os incêndios no país são a alegoria perfeita de um certo conceito de civilização onde acontece à humanidade o mesmo que sucede à floresta, tudo arrasado, queimado, uma ruína em cima dos olhos de toda a gente e toda a gente a olhar para o lado como se ainda fosse possível esperar pela morte sem nos darmos conta do pântano onde estamos a enterrar os nossos filhos. Parece-vos depressivo, o discurso? Sofrerei eu de neurastenia? Abram os olhos, olhem à vossa volta, e digam-me se estou errado.
aqui : http://universosdesfeitos-insonia.blogspot.pt/2012/09/regresso.html
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