10/09/2010

inspiração

Nosso curso de primeiro ano está quase concluído. Eu esperava inspiração, mas o sistema espatifou minhas esperanças. Essas ideias passavam-me pela mente enquanto, no vestíbulo do teatro, eu punha meu sobretudo e lentamente enrolava o cachecol no pescoço. De repente alguém me cutucou. Voltei-me e vi Tortsov. Notara meu estado de desânimo e vinha indagar a causa. Dei-lhe uma resposta evasiva, mas insistiu, teimoso, fazendo uma pergunta atrás da outra. - Como se sente, agora, quando está em cena? - perguntou, num esforço para compreender minha decepção com o sistema. - É justamente essa a dificuldade. Não sinto nada fora do comum. Sinto-me à vontade, sei o que devo fazer, tenho um motivo para estar ali, tenho fé nas minhas ações e creio no meu direito de estar em cena. - E o que é que você quer mais? Acha que isso é errado? Confessei-lhe então a minha ânsia por sentir-me inspirado. - Não me procure para isso. Meu sistema nunca fabricará inspiração. Pode apenas preparar um terreno favorável a ela. Se eu fosse você, deixaria de correr atrás desse fantasma, a inspiração. Deixe-o por conta daquela fada miraculosa, a natureza, e dedique-se àquilo que está nos domínios do controle humano consciente. Ponha um papel na estrada certa e ele irá para diante. Ampliar-se-á, tornar-se-á mais fundo e, finalmente, levará à inspiração. Constantin Stanislavski "A preparação do ator", edição Civilização Brasileira 2008, pág. 331

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