07/02/2013

amor


Os enamorados interrogam-se continuamente acerca do que estão a pensar. "Em que pensas?" é uma pergunta espontânea do enamorado, que, no fundo, quer dizer "pensas em mim?" Mas não basta um sim, com essa pergunta quer saber do outro, da sua vida, dos seus pensamentos mais recôndidos, quer a sua total transparência em toda a sua riqueza e concrição, para poder aí inserir-se como objecto autêntico de amor, mas também como intérprete, consolação, guia. Não basta por isso que o outro responda "em ti" deve também indicar a via real, concreta, individual, daquele percurso. O "em ti" é sempre o ponto de partida e o de chegada, mas através da riqueza da concrição real, que é transfigurada e transubstanciada. Eis uma outra palavra religiosa: mudança de substância. O mesmo facto, até agora banal ou mesmo insignificante, uma vez dito e contado, aceite e inserido no discurso de amor, sai transfigurado, dotado de valor, o mesmo acontecendo a um defeito, uma fraqueza, um sofrimento, uma doença. O enamorado ama também as feridas da amada, os órgãos internos do seu corpo (o coração, o fígado, os pulmões) e os órgãos internos da sua alma (a infância, os sentimentos para com a mãe ou o pai, o amor por uma boneca). E porque o enamoramento é também resistir ao amor, afastar-se, querer-se separar, também este "não querer" deve ser dito, confessado, superado e absolvido.

"Enamoramento e Amor" - Francesco Alberoni, bertrand editora

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