27/01/2009
Insónia: DIA 27
O dia acorda claro e intenso,
sol que brilha em mim, apesar da geada.
Com os pés na terra faço-me ao caminho,
subo, paro e desço avenidas, ruas, becos, atalhos,
calçada que calcorreio em pedra dura e fria.
Nas encostas destas colinas passo por pessoas,
muitas pessoas, todas numa azáfama de cá para lá,
de lá para cá e de todo o lado para nenhum,
que o meu caminho só eu sei e eles os deles.
O céu está azul, tão azul que mais azul não podia estar,
as gaivotas rodeiam o rio, quase mar de salgado que é.
Em voos picados na procura de sustento atiram-se à vida.
Detenho-me nesta imagem, um segundo, dois segundos,
talvez uma vida, agora não que não posso,
cinco segundos, dez segundos e atiro-me ao caminho,
picado por uma ânsia que arranco ao tédio.
Neste frenesim, ando e procuro procuro e ando,
membros soltos em movimentos lineares desatinados,
passos desarranjados que liberto ao ar,
que, brisa fria, me inunda e aquece o corpo.
Ossos, ligamentos, tendões, músculos, pele,
monte de carne que sua, sonha e segue.
Se encontrar as escadas, feitas de degraus,
que me levem a ti, a claridade brilhante serei eu.
Nesta loucura, abraço as cores, todas as cores.
Abraço o preto roupa que sou e me cai mal,
abraço o azul que do céu cai sobre mim,
abraço o marfim da calçada que percorro,
abraço o lilás do arco-íris que imagino,
abraço o roxo escuro misterioso do rio,
abraço o verde das árvores que cheiro,
abraço o castanho das raízes profundas,
abraço o laranja fogo, paixão em mim,
abraço o púrpura do poente tardio,
abraço o ocre desbotado que sou,
abraço o amarelo dourado do sol,
abraço o prata reflexo complexo,
abraço o azul mar do horizonte,
abraço o turquesa teus olhos,
abraço o rosa que são lábios,
abraço o bronze que é carne,
abraço o vermelho coração,
abraço o encarnado paixão,
abraço o branco gelo,
abraço o cinza pó.
Papel ao vento,
transparente,
desordenado.
E a vida,
toda a vida.
Comédia trágica que trago dentro do peito.
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